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Polêmica: vamos falar de flankers?

Perfumart - post sobre flankersFaz tempo que eu venho pensando em escrever um post sobre este assunto. E por mais que eu tente ser imparcial com as minhas publicações, tem horas que não dá. Até porque, este é o meu espaço para colocar, por escrito, meus conhecimentos sobre o assunto, as novidades mundiais, minhas análises sobre as mais diversas fragrâncias mas, também, minhas opiniões pessoais sobre tudo que envolve a perfumaria. E cá pra nós, o que movimenta a internet, hoje em dia, é uma boa polêmica! Por esse motivo, resolvi trazer à tona essa questão dos flankers.

Mas o que é o flanker?

De forma simples, em se tratando de perfumes, o flanker é uma versão diferente de algo que já existe no mercado. De forma mais complexa, uma boa definição mercadológica seria: “Flanker é a extensão de uma marca existente para criar um outro produto ou marca, com aumento de market share. O novo produto pode ser em tamanho diferente, sabor, aroma ou tipo, mas ainda cai dentro da mesma categoria de produtos”. A imagem acima mostra, com clareza, o que seriam os flankers na perfumaria.

Eu não entendo, realmente, porque as pessoas reclamam tanto dos flankers. Toda vez que uma empresa anuncia um novo flanker ao redor do mundo, a primeira coisa que aparece é uma crítica. Os fóruns se enchem de perguntas do tipo: “De novo?”, “Até quando?”, “Mais um com essa nota?”, “Até esta marca se rendeu aos flankers?”, “Quando irão inovar?”, entre tantas outras. E aí, eu começo a questionar até onde vai a real paixão pela perfumaria e até onde as pessoas entendem de mercado.

Para início de conversa, desde que eu me entendo por gente, existe um ditado que diz: “nesta vida nada se cria, tudo se copia”. E não é só na perfumaria não! Há quantos anos a gente se depara com um carro que é lançado e traz, na sequência, versões hatch, sedã, sport, etc.? A mesma coisa acontece no mercado dos calçados femininos: o mesmo sapato é feito em versões de bico fino, salto alto, salto baixo, salto fino, salto grosso, sem salto, etc. Hoje em dia, para complementar a coleção, a bolsa tem a mesma estampa, além da carteira e da case do notebook. Sem falar na capa do tablet e do celular. Tudo isso são versões de um mesmo tema e/ou categoria.Perfumart - post sobre flankers

Em um mercado que envolve BILHÕES de dólares por ano e concorrência acirrada, não poderia ser diferente. E este mercado mudou, junto com a globalização. Até os anos 90 (sem falar nas décadas mais antigas), um novo perfume demorava cerca de 3 anos (em média) para ser lançado. Mas era uma outra época: os ingredientes eram naturais, era preciso maior tempo de maturação da fragrância, só existiam cerca de cinco top models para estrelar uma campanha e poucos eram os profissionais especializados.

Há cerca de 1 década – época em que o mercado consumidor começou a sentir as maiores mudanças – tudo ficou diferente. E, justamente por isso, começou uma onda de crescimento do mercado de nicho, no qual os perfumistas cansaram de ter seu poder limitado por causa do fator financeiro. Ao mesmo tempo, percebeu-se que era necessário investir mais dinheiro em campanhas complexas, que não se limitavam apenas às páginas das revistas de moda, como nos anos 80, por exemplo. São comercias de TV, cinema, fotos, cartazes, vídeos para web, redes sociais diversas, etc. E para tal, é preciso gastar muito mais, inclusive, com a modelo do momento ou com o ator mais cobiçado de Hollywood. E isso também custa caro!

E como as empresas encararam esta mudança?

É simples. Ao invés de criar um conceito por trás de uma nova fragrância, gerando a necessidade de uma campanha publicitária complexa, criação de novos frascos, entre outras variáveis, as empresas encontraram uma solução infinitamente mais barata: utilizar o contrato com a modelo ou a(o) atriz(ator) vigente, aproveitar a fabricação e o molde do frasco anterior, alterando apenas a cor ou os detalhes, criando um perfume que possa competir com o lançamento da concorrência. O efeito colateral veio em forma de uma “bola de neve”: todos os meses, algo chega ao mercado, em forma de flanker.

Existem linhas que já possuem mais de 10 versões sobre o mesmo tema, como: L’eau D’Issey, Cool Water, etc. Mas isso não se restringe apenas ao mercado dos Designers. Marcas de prestígio e Alta Perfumaria também não ficam atrás. Recentemente, a Hermès lançou uma nova versão da linha Un Jardin; a Montale possui uma imensa linha criada sobre o Oud e a Maison Kurkdjian adicionou um novo flanker à uma de suas coleções nobres, que também exploram o OUD, entre tantas outras.

Perfumart - post sobre flankers

O resultado deu tão certo para os empresários, que eles encontraram uma forma de continuarem ganhando milhões de dólares por ano, com custo menor. Então, algo mais dramático começou a acontecer: fragrâncias distintas, completamente diferentes da linha existente, começaram a ser lançadas. Um exemplo muito claro disso é CK One Shock, um perfume que não segue, em nada, o histórico da linha Ck One, famosa por seu aspecto versátil e jovial, refrescante e gerador de inúmeras versões de verão (summer). Embora tenha sido considerado um desrespeito aos fãs da linha Ck One, poupou ao bolso da casa Calvin Klein muito dinheiro, que teria sido gasto com a criação de um conceito totalmente novo, criando-se uma linha Shock, com direito a frascos novos, nova campanha, etc., tudo aquilo que já foi citado anteriormente.

E a verdade é que eu enxergo este movimento como um caminho sem volta, pelo menos, por enquanto. Mas o mercado é cíclico e tudo pode voltar a ser como antigamente. Até lá, não adianta ficar reclamando sobre o mais novo flanker anunciado, porque vai continuar sendo assim. E quem quiser algo realmente novo, vai precisar esperar por uns 5 anos (pelo menos), até que uma nova tendência se crie e uma nova linha seja lançada por alguma marca.Perfumart - post sobre flankers

Particularmente, eu acho muito chato ver tantas reclamações. Se a pessoa não concorda com o mais novo lançamento feito com “oud” ou com o 10º flanker da casa X, é só não comprar. Reclamar o tempo todo não irá mudar isso. Até porque, para cada crítica postada, 100 frascos são vendidos ao redor do mundo. É burrice ficar enxergando os flankers como “falta de criatividade”. Eles vieram para ficar e serem vistos como “algo novo”. Esqueçam a roupagem e pensem no conteúdo. Já bastam as reformulações, que vieram para estragar inúmeras criações de sucesso, além das edições limitadas, que não trazem nada de diferente em termos de composição, mudando apenas o frasco (ou algum outro detalhe), só para agradar aos colecionadores mais dedicados por uma marca ou linha específica de fragrâncias.

Aliás, até para se criar um bom flanker ficou complicado, já que o consumidor fiel espera que aquela nova versão anunciada traga, de alguma forma, algo da versão original. É o tão falado “respeito ao DNA”, que permite que a fragrância se mantenha próxima do que já foi, com alguma pequena mudança. Mas com as reformulações impostas, está cada vez mais difícil manter a qualidade e o padrão da versão original, quanto mais criar algo no mesmo estilo e em versões multifacetadas.

Perfumart - post sobre flankers

Por fim, eu não poderia encerrar este post sem fazer uma crítica à essa tal “exclusividade”, que tanto se prega por aí. Que coisa mais chata e besta!

A única coisa que nos torna exclusivos é a nossa impressão digital. Essa sim é única! Fora isso, nós somos todos iguais – principalmente, sobre uma maca de hospital, anestesiados e nas mãos de um médico qualquer. Não é um perfume que torna uma pessoa mais exclusiva ou mais popular. Ser popular não é ruim! Muitos sonharam com isso na adolescência e outros passam a vida inteira tentando.

Também não é um perfume especial ou raro que te transforma na pessoa mais bonita e atraente do pedaço. Um bom perfume tem o poder de melhorar a sua autoestima, bem como a imagem que você deseja passar para os outros. Mas não faz mágica!

Pessoalmente, as maiores lições de vida que eu já recebi vieram de pessoas que, provavelmente, nem dinheiro tinham para comprar um perfume baratinho. E neste mercado, se você quiser algo exclusivo mesmo, vai ter que pagar muito caro para tal.

E já que o mercado está assim, então que venham mais flankers, porque eu quero é ter mais opções de escolha. E você?

 

*Texto: Perfumart / Imagens: reprodução


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𝘽𝙤𝙧𝙧𝙞𝙛𝙖𝙣𝙙𝙤 𝙘𝙤𝙣𝙝𝙚𝙘𝙞𝙢𝙚𝙣𝙩𝙤 𝙝𝙖́ 𝙖𝙣𝙤𝙨. Crítico de fragrâncias, jurado de premiações nacionais nas categorias de perfumaria fina e cosméticos masculinos, além de consultor particular de estilo em fragrâncias e criador do Perfumart, blog especializado no assunto.

8 comments on “Polêmica: vamos falar de flankers?

  1. Daiane Coimbra

    Olá, por que não falamos mais profundamente sobre o padrão dos Flankers? Quase sempre tem um “florale” para agradar quem goste de florais, tem um intense, um legere, e por aí vai…

  2. Rodrigo Carvalho

    Perfeita a explicação sob sua ótica … somos todos flankers de pai e mãe rsrs! Parabéns pelo conteúdo.

  3. Fernando Camargo

    Sensacional. … melhor matéria que já li nos últimos tempos e me soou como poesia o último parágrafo. Parabéns pela excelente publicação.

    • Obrigado Fernando. Se você enxergou poesia, então já me sinto feliz com o resultado! 🙂

  4. Hildebrando Filho

    Boa tarde Cassiano!
    Excelente matéria, bem abrangente e muito atual… Concordo quando vc diz que não entende o porque de tantas reclamações em relação aos flankers, eu também não vejo motivos para tanto mi mi mi, se não gostam , simplesmente não comprem. Eu amo o Joop! Homme, estou In Love com o Joop! Homme Wild e ansioso para conhecer o Homme Extreme. Como vc mesmo disse: Na vida nada se cria… Tudo se copia! Abraços!!

    • É bem por aí…
      Criticar é fácil, mas entender o que existe por trás e o dinheiro que se economiza com isso, é para poucos. Obviamente, eu coloquei a minha opinião pessoal sobre o assunto. Cada um tem o direito de desejar aquilo que bem entender. E pagar por isso tb!

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