Varanasi foi desenvolvido em 2018 e pertence à linha Botânica de perfumes criados por Maria Paula Franco, e sua fragrância é classificada como oriental-âmbar.
A inspiração vem da cidade de Varanasi, também conhecida como Benares e uma das cidades mais antigas, nais quais ainda é possível ver o hinduísmo presente e de forma intensa. Seu nome significa “Porta do Céu” e, segundo os Brâmanes, foi fundada por Shiva há mais de 5.000 anos.
A fragrância de Varanasi tenta transmitir a força e a espiritualidade do local e nasceu após uma viagem realizada pela perfumista à cidade. Aliás, ela afirma que vários óleos essenciais foram trazidos de lá, além de um OUD muito precioso do norte da Índia. Infelizmente, esta também é a razão pela qual o perfume foi produzido em edição limitada.
A composição lista notas de petitgrain, arruda, bergamota, frangipani indiano, cardamomo, tuberosa indiana, âmbar indiano, pimenta negra, baunilha, cannabis, cedro vermelho, musgo de carvalho, nardo verde, sândalo, tabaco e OUD indiano.
Ao tocar a pele, a fragrância é incômoda e nada comercial. Eu até poderia enfeitar a resenha com palavras bonitas e termos técnicos, mas a verdade é que a saída é forte e chega a ter nuances fecais. Duas coisas ficaram muito claras para mim nesse sentido: em primeiro lugar, o OUD utilizado é aquele que despontou na perfumaria, há alguns anos, e foi descartado, rapidamente, quando as empresas começaram a trabalhar com aqueles que possuem nuances mais amadeiradas ou achocolatadas. Mas quem teve contato com esse tipo de matéria-prima a qual me refiro, irá se identificar com o OUD desta criação.
O outro ponto seria uma interpretação mais religiosa e literal da cidade, uma vez que Varanasi costuma ser relatada como um local amado por uns e odiado por outros, especialmente os turistas. Isso porque, a cidade tem um ar cinzento, há muita fumaça – não só de incensos perfumados, como também dos rituais de cremação de corpos a céu aberto –, as vielas abrigam fezes e urina de animais, como cabritos, cachorros e vacas, além do rio Ganges, que é sagrado e as pessoas se banham nele.
Particularmente, nunca estive na Índia, mas a fragrância traz muito dessa imagem crua e caótica que se desenha em minha mente, quanto mais pesquiso sobre Varanasi.
E se você acha que as notas de bergamota e petitgrain vão trazer algum teor cítrico para a saída, se enganou. Assim que o cheiro do impacto inicial se dissipa, a fragrância traz um lado herbal e aromático, que se mescla às facetas florais de forma equilibrada e lenta. Gosto de como a tuberosa se apresenta e da forma como o cardamomo e a baunilha conferem um aspecto esfumaçado e doce.
Quando a perfumista lista a cannabis, vale explicar que ela fez uso da tintura de Khus hindu, que é resinosa e rica em cannabidiol. Junto com o musgo e o nardo, esses ingredientes deixam a base mais musgosa e verde. Ainda assim, o tabaco envelopa a composição e resulta em uma fragrância especiada e cheia de facetas acouradas.
Varanasi tem um pé no passado, brincando entre os estilos boozy e fougère, mas seu calor é ambarado e seco. Também é, na minha opinião, uma fragrância desafiadora e perfeita para o portfólio de uma marca do segmento Indie, porque (no fundo) é isso que as pessoas buscam ao fugir das grifes mais conhecidas.
Varanasi se mostrou uma bela surpresa. É, ao mesmo tempo, sagrada e profana; caótica e organizada; decadente e próspera.
*imagem: reprodução / alquimiaporpaulafranco.com.br