Nos arredores da Riviera Francesa, mais exatamente na cidade de Grasse, conhecida como o berço da perfumaria, floricultores, usinas de beneficiamento de matéria-prima e fabricantes de perfumes se unem para que o seu conhecimento seja reconhecido pela Unesco (braço cultural das Nações Unidas) como patrimônio mundial da humanidade, assim como ocorreu com a gastronomia francesa, em 2010, ao ser incluída na lista de patrimônio imaterial da humanidade. Ao todo, mais de 180 práticas culturais ou tradicionais já foram inscritas nessa lista, ao longo dos anos.
Uma tradição que passa por gerações.
Ao percorrer suas terras cultivadas com perfumadas rosas-de-maio, matéria-prima usada na fabricação de inúmeras fragrâncias de prestígio, Joseph Mul (77 anos) segue os passos de seu tataravô – que começou a cultivar flores para perfumes em 1840 – e faz questão de perpetuar essa tradição, de geração em geração, seguindo os segredos da floricultura. Atualmente, prepara-se para entregar as rédeas da empresa a seu genro, Fabrice Bianchi.
“O aprendizado é feito na própria plantação, em meio às flores. Mantemos uma troca constante de experiências – duas gerações que interagem, transmitindo uma à outra o know-how indispensável ao manejo das plantas“, explica Fabrice Bianchi enquanto colhe uma rosa-de-maio, também conhecida como rosa Centifolia. “Essa rosa nasceu para seduzir o olfato. Seu aroma é aveludado e perfeitamente equilibrado“, diz ele.
É para perpetuar essa rica herança que Joseph Mul, figura bem conhecida da indústria de perfumes, juntamente com outros floristas de Grasse estão se mobilizando para que a cidade, situada no sudeste da França, seja tombada como patrimônio imaterial pela Unesco. Além dos floricultores, o movimento conta com o apoio de fabricantes de perfumes franceses e de empresas responsáveis pelo beneficiamento de matérias-primas.
Berço da perfumaria.
Grasse, cidade com cerca de 50 mil habitantes, é um importante polo para o setor de perfumes, desde os tempos de Luís XIV, no século XVII. Na época, os fabricantes de couro, presentes na região desde a Idade Média, criaram óleos aromáticos para perfumar seus produtos, principalmente luvas. Dizem as más línguas, que o Rei Sol – grande apreciador do agradável aroma exalado por esses óleos – exagerava na dose, chegando a passar mal. Mito ou realidade, o importante é que, com o aumento da demanda, muitas floriculturas começaram a surgir na região.
Nos anos 70, porém, o crescimento imobiliário e a concorrência de produtores estrangeiros, que ofereciam preços melhores, colocou em risco a indústria de perfumes implantada em Grasse. Apesar dos ventos contrários, Grasse conseguiu consolidar seu posicionamento como um dos principais polos mundiais do setor de perfumes, acolhendo grandes nomes da indústria, como Robertet e Fragonard. A indústria de perfumes ainda é responsável por cerca de 3 mil empregos só nessa região.
Atualmente, o setor de perfumes mantém estreitas relações com o universo da moda e das celebridades – tendência que teve início em 1921, com Coco Chanel e seu N°5. Desde então, os perfumes se tornaram um elemento importante das franquias de grandes estilistas. Um bom exemplo é o Grupo LVMH, gigante mundial do luxo, que em setembro vai inaugurar um laboratório de criação de perfumes em Grasse, onde serão desenvolvidas as próximas gerações de fragrâncias da Dior e da Louis Vuitton, contribuindo para reafirmar o posicionamento de Grasse como polo mundial da indústria de perfumes.
A prefeitura de Grasse exalta a parceria recente com o grupo LVMH: “os perfumistas se inspiram na nossa produção”. Em 2006, uma edição limitada de Very Irrèsistible, da Givenchy, consumiu 1.200 pétalas da rosa centifólia de Châteauneuf, em Grasse. Em 2010, J’Adore L’Or, da casa Dior, colocou Grasse dentro de ânforas de cristal Baccarat. E esses são apenas alguns exemplos.
“Perfume é um conceito e um conjunto de emoções que podem ser compartilhadas“.
Nas fábricas instaladas em Grasse e arredores, são produzidos muitos perfumes para marcas de prestígio. O desenvolvimento das fragrâncias utiliza ingredientes naturais ou sintéticos originários de várias regiões do mundo.
“Em nenhum outro lugar do planeta é possível encontrar tal concentração de conhecimento. É para cá que os protagonistas da indústria têm que vir quando querem desenvolver um produto natural“, afirma Jacques Cavallier-Belletrud, filho e neto de fabricantes de perfumes originários da região e, atualmente, estilista e perfumista da Maison Louis Vuitton.
Jacques juntou-se ao coro de profissionais que defendem o pedido feito pela França, em março de 2015, para que a expertise em perfumes desenvolvida por Grasse, ao longo de séculos, seja registrada pela Unesco como patrimônio cultural imaterial. Nacionalmente, esse conhecimento já foi tombado pela França, em 2014. Mas o que tais profissionais esperam é o reconhecimento internacional por parte das Nações Unidas.
“Os perfumistas têm uma linguagem própria impregnada de símbolos e é por meio dela que conseguimos transmitir emoções com extrema rapidez. Quando estou com meu pai, nossa comunicação é instantânea“, revela Jacques Cavallier-Belletrud. “Perfume é um conceito e um conjunto de emoções que podem ser compartilhadas“.
Para Carole Biancalana, representante da quarta geração de uma família que cultiva flores para a indústria de perfumes, é fundamental que a tradição desenvolvida em Grasse seja reconhecida mundialmente, não apenas como tributo à história, mas também para o futuro do setor. “Precisamos que essa tradição seja tombada como patrimônio cultural, a fim de atrair jovens talentos para a profissão e homenagear as gerações passadas“, defende ela.
Carole é uma das produtoras que, desde 2014, possui contrato com a Dior, o que garantiu que suas colheitas sejam vendidas à grife francesa. “Antes, tudo era instável”, diz ela, que já negociou com marcas como Thierry Mugler e Estée Lauder.
*Fontes: BBN.com e Veja SP / Textos editados / Imagens: reprodução Pixabay / Pexels (free)
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Acho justo, justíssimo, Cassiano! Patrimônio incalculável da humanidade 🙂
Eu acho digno! 🙂